sábado, 20 de fevereiro de 2016

Submissão

Submissão, de Michel Houellebecq (Alfaguara, 2015), é uma distopia que me soou estranhamente familiar. Familiar tanto por suas referências a nomes, figuras políticas, partidos e locais reais, como também pela estranha coincidência de datas: estava lendo Submissão exatamente na mesma semana de novembro de 2015 em que a França sofreu os ataques dos terroristas do Estado Islâmico. Além disso, os mesmos atores políticos presentes no livro também estavam na mídia em função das eleições na França, como Marine Le Pen e Jean-François Copé.


Contada através da ótica de um professor universitário de literatura (François) em Paris, no ano de 2022, a trama gira em torno de um processo eleitoral em que a briga entre os partidos tradicionais de esquerda e direito acaba levando à vitória de uma Fraternidade Muçulmana e à possibilidade de implantação da Sharia na França. 

O livro é muito interessante, muito bom e verossímil. Mostra o processo crescendo e se acelerando progressivamente, bem à vista dos perplexos membros da elite francesa, em um paralelo muito curioso com o que se vê no verídico "No Jardim das Feras", sobre a ascensão do nazismo na Alemanha e que comentei em julho de 2014Na verdade, o foco na "revolução silenciosa" é um dos pontos que mais chamam a atenção no texto e é reforçado explicitamente em trechos como o abaixo: 

"Talvez seja impossível, para pessoas que viveram e prosperaram em determinado sistema social, imaginar o ponto de vista dos que, nunca tendo nada a esperar deste sistema, encaram sua destruição sem nenhum terror especial." 

Ou em: 

"(...) estava cada vez mais marcado pelo pensamento de Toynbee, por sua ideia de que as civilizações não morrem assassinadas, mas se suicidam." 

Houellebecq talvez exagere um pouco na descrição da vida amorosa de François, que não agrega praticamente nada ao enredo, mas mesmo assim é uma obra imperdível.