sábado, 10 de fevereiro de 2018

Uma dose carnavalesca de otimismo, para variar

Nestes dias de Carnaval é bastante comum nos depararmos com posts nas redes sociais do tipo “o Brasil do jeito que está e o pessoal pulando Carnaval...”, ou “se o povo usasse a mesma energia do Carnaval para lutar por um país melhor...”. É realmente muito fácil nos deixarmos deprimir pela enxurrada de notícias negativas que vemos nos noticiários todos os dias, então eu gostaria de compartilhar um ponto de vista um pouco diferente sobre o Brasil, que talvez ajude o pessoal a ver um outro lado e se animar um pouco. 

Tive oportunidade de participar, há alguns meses, de uma palestra para empresários do setor de embalagens proferida pela jornalista de economia Míriam Leitão em um evento pequeno promovido pela Henkel dentro da programação da Fispal Tecnologia 2017. O tema era tendências econômicas, mas Míriam usou o espaço para apresentar a sua visão macro sobre o futuro do Brasil e transmitiu um otimismo bem fundamentado, que teve um impacto sensível sobre os que tiveram a sorte de participar do evento. 

O primeiro insight que ofereceu foi sua visão de que o Brasil vem evoluindo paulatinamente em ciclos de formação de grandes “consensos nacionais”. De tempos em tempos, mais especificamente a cada década, o país tende a compartilhar uma visão comum com relação a um de seus grandes problemas fundamentais e este grande consenso se torna parte do motor da mudança, levando a uma solução definitiva de questões que até então pareciam insolúveis. Teríamos passado, assim, pelos seguintes ciclos nas últimas décadas: 

- Década de 1980 – Processo de redemocratização, com o fim de um governo militar de mais de vinte anos; 
- Década de 1990 – Estabilização econômica e fim do ciclo de hiperinflação; 
- Década de 2000 – Implantação de programas sociais de distribuição de renda e combate à fome. 

Cada um destes consensos atacou problemas críticos e estabeleceu novas realidades tão solidamente estabelecidas que nem se cogita a possibilidade de retorno à condição anterior – não é mais factível imaginar-se hoje o retorno de uma ditadura militar, da mesma forma que não temos mais o medo constante de um ciclo de hiperinflação. Também não há como se imaginar a erradicação de programas de distribuição de renda que, por mais que precisem de aperfeiçoamento, não deixam de ser fundamentais e irreversíveis. 

Estaríamos agora, na década de 2010, passando por um novo ciclo, desta vez atacando o problema da corrupção endêmica e dos vínculos escusos entre a velha política e as velhas estruturas empresariais. Assim como nos ciclos passados, o processo exige sacrifícios, mas ao que tudo indica, está se estabelecendo no Brasil um novo patamar de governança e uma nova forma de se fazer negócios, em que as práticas antigas do compadrio, da sonegação e do jeitinho deixaram de ser o padrão aceitável e natural e passaram a ser o que sempre deveriam ter sido: a exceção condenável.


A corroborar a visão de Míriam Leitão sobre o tema, vem a opinião de um amigo com quem conversei em dezembro, diretor de compliance de uma grande multinacional europeia e uma das maiores referências em governança corporativa no Brasil. Estava me queixando da situação de concorrência desleal que encontro em meu mercado de atuação, com concorrentes praticando sonegação escancarada e subfaturamento de produtos e a resposta dele foi surpreendente: riu. Disse: “Você não entendeu ainda, não é? O Brasil não está mudando. O Brasil já mudou. Isso que você está me contando não existe mais. Não há mais espaço. Pode ser que ainda existam empresas operando dessa forma, sim. Mas o caso é que esse pessoal já está preso. Pode ser que ainda não saibam, mas já estão presos”. 

O ponto principal do argumento é que há toda uma nova situação de ferramentas de controle nas mãos da fiscalização, toda uma nova geração de profissionais no setor público e principalmente todo um clima de combate às práticas antigas que fazem com que corrupção e sonegação tendam a se tornar inviáveis e arriscadas demais para serem compensadoras. Quem não acordou ainda para essa realidade está em sério risco. Ou já está preso. 

O segundo insight compartilhado na palestra foi o da situação estratégica do Brasil no cenário mundial previsto para as próximas décadas. Em diversos aspectos temos razões concretas para otimismo: 


1 – O Brasil é detentor da maior biodiversidade do mundo, que é um ativo fundamental e extremamente valioso para o desenvolvimento de tecnologias para desde a medicina, até as indústrias de alimentos e cosméticos; 

2 – O Brasil possui uma das maiores reservas hídricas do mundo, tanto em termos de rios quando em termos de aquíferos subterrâneos e que se torna mais valiosa a cada ano (vide a situação caótica na Cidade do Cabo hoje, ou mesmo a crise por que passou a cidade de São Paulo pouco tempo atrás); 

3 – Temos um potencial gigantesco em termos de energias limpas: o país possui condições ideias para instalação de usinas de energia solar em praticamente todos os estados da federação, à exceção talvez do Paraná. Mesmo no caso do pior deles, a condição ainda é melhor do que na Alemanha, que hoje é o maior produtor mundial de energia de origem solar. Além disso, o potencial para energia eólica em terra é dos melhores do mundo: nossos ventos são de baixa altitude, constantes e de baixa turbulência – uma condição ideal para a implantação de usinas eólicas; 

4 – O Brasil é um grande produtor e exportador de alimentos e continuará sendo. Além do sucesso atual do agronegócio brasileiro, as atividades de pesquisa desenvolvidas em institutos como a Embrapa já garantem a disponibilidade de sementes adaptadas às situações de mudança climática que o planeta vem enfrentando, adequadas às condições de produção previstas para as próximas décadas, garantindo a sustentabilidade de nossa produção a longo prazo; 

5 – O tamanho da população e ritmo de crescimento são adequados, não exercendo pressões demográficas excessivas. Ou seja, a população jovem não é tão grande que represente um problema nem estamos enfrentando um processo de envelhecimento que implique em risco de escassez de mão-de-obra; 

6 – A disponibilidade de terras no Brasil para expansão agrícola, sem que seja necessário desmatamento adicional, é extraordinária. O estoque disponível é atualmente de 60 milhões de hectares, equivalente exatamente à soma das áreas totais da Alemanha e do Reino Unido. 

Note-se que todos os seis pontos mencionados acima são concretos e representam vantagens estratégicas reais a curto e médio prazos. Não se está mencionando pontos questionáveis como o valor das reservas de petróleo no pré-sal, por exemplo. Alguns são ainda intangíveis, mas não por isso deixam de ser uma realidade. 

Enfim, sabemos todos que o Brasil não é uma nação desprovida de problemas. Pelo contrário, somos pródigos nesse sentido. Mas a mensagem que gostaria de transmitir aqui é a de que às vezes precisamos ter um certo distanciamento dos noticiários negativos e olhar o cenário macro – há muitas e boas razões para acreditarmos no nosso futuro e podemos, sim, celebrar. 

“(...) Se tudo correr bem, chegaremos um dia a ser como outra nação desenvolvida qualquer – algo semelhante, digamos, a um estado do Sul dos Estados Unidos ou a um país do Mediterrâneo europeu (...). “Se tivermos racionalidade e competência, chegaremos lá.” - Eduardo Giannetti