domingo, 23 de setembro de 2012

Indignação

Philip Roth é um dos maiores escritores americanos da atualidade e o único escritor americano vivo a ter sua obra completa publicada pela Library of America. Eu já havia lido dois livros dele: Adeus Columbus e Fantasma Sai de Cena, e não havia ficado particularmente empolgado com nenhum dos dois. Acabo de ler Indignação e, agora sim, acho que posso recomendá-lo. Não que eu me julgue qualificado para questionar a obra de um ganhador do Pulitzer, mas eu simplesmente achei os dois primeiros que li muito chatos e um tanto amargos. (A rabugice de Philip Roth é tão notória que há um episódio dos Simpsons em que aparece o seguinte aviso numa faixa anunciando a feira literária de Springfield: "Cuidado: Philip Roth pode estar de mau humor".)


Entretanto, Indignação é muito bom. Conta a estória de Marcus Messner, um garoto de cerca de 18 anos, filho de um açougueiro kosher de Newark no ano de 1951 - 2o ano da guerra da Coréia. Messner estuda em uma faculdade local e mora com os pais, até que seu pai tem um presságio ruim com relação ao futuro do filho e passa a adotar uma postura superprotetora, intolerável para Marcus.

Marcus, apesar de um ateu racionalista e fã de Bertrand Russell, muda então para uma universidade cristã no interior de Ohio (Winesburg), onde conhece e se apaixona por Olivia Hutton, uma garota tão deslocada quanto nele no ambiente americano conservador da Winesburg. Entre sua preocupação obsessiva com a possibilidade de ser recrutado e mandado para a Coréia, seu caso com Olivia e seus desentendimentos com o reitor da universidade, Marcus vai tomando uma série de pequena decisões e desencadeando uma série de eventos que vão levando-o lentamente ao destino trágico pressentido e temido por seu pai, como mostrado no trecho abaixo (de uma discussão entre Marcus e ele):

"Então papai, qual a razão para tudo isso?"
"A razão é a vida, onde o menor passo em falso pode ter consequências trágicas"
"Ah, meu Deus, você fala como se fosse uma cartomante."
"Ah, é? Falo? Não como um pai preocupado mas como uma cartomante? É isso que pareço quando estou falando com meu filho sobre o futuro que ele tem à sua frente e que qualquer coisinha pode destruir, a menor coisinha?"

Além de um romance muito bom, o livro é fantástico como retrato da cultura e do comportamento nos Estados Unidos no início dos anos 50 e do clima do front doméstico durante uma guerra com a qual temos muito pouco contato, ao contrário do que acontece com a guerra do Vietnam. Mudou a minha visão com relação à obra de Philip Roth e agora quero ler pelo menos outros dois: Pastoral Americana (que lhe rendeu o Pulitzer citado acima) e Complô contra a América, em que imagina como seriam os Estados Unidos governados por Charles Lindbergh (em vez de Roosevelt) e simpática a Hitler.

Para quem ler Indignação, posso recomendar também uma entrevista de Roth sobre o livro disponível em: http://www.youtube.com/watch?v=rLbhzf6Fx_A

Para mais sobre Philip Roth, o link da Wikipedia apresenta informações interessantes: http://en.wikipedia.org/wiki/Philip_Roth

domingo, 16 de setembro de 2012

Dívida de Honra

Todo mundo gosta de ler alguma bobagem de vez em quando, especialmente nas férias. A minha bobagem preferida para férias atende por Tom Clancy: são livros enormes (para quando você tem tempo disponível para desperdiçar sem dor na consciência), baratos para comprar no Kindle e duros de largar.


Para quem não sabe de quem estou falando, ou nunca fez associação entre os livros e filmes que ele escreve, é o autor criador dos personagens Jack Ryan e John Clark, que você já deve ter visto em filmes como Caçada ao Outubro Vermelho, Perigo Real e Imediato ou A Soma de Todos os Medos, ou ainda em videogames como a série Rainbow Six, Ghost Recon ou Splinter Cell. Sim, se você prestar atenção, todos esses filmes e jogos, assim como os livros, são interconectados e a maior parte deles integra uma sequência.

Nas últimas férias eu li "Dívida de Honra", que não foge do roteiro clancyano tradicional: uma conspiração dos zaibatsu inicia uma guerra entre Japão e os EUA e Jack Ryan é chamado para ajudar a resolver a crise com seus insights fabulosos sobre política internacional. O curioso em "Dívida de Honra" é como a coisa começa a partir de uma briga comercial entre empresas de autopeças, avança por um lote de tanques de gasolina defeituosos, passa pela destruição de dois submarinos nucleares, uma invasão japonesa nas Marianas e chega a um ataque em Washington, que é o ponto alto do livro.

Uma coisa que se pode dizer a respeito de Clancy é que ele tem um cuidado bastante grande em imaginar cenários de guerra e em tornar factíveis situações absurdas. Neste caso, a solução que ele dá para equilibrar as forças entre Japão e EUA a fim de tornar o conflito verossímil é bastante elegante: ele consegue dar armamentos nucleares aos japoneses, criar uma crise financeira mundial, incapacitar os porta-aviões americanos no Pacífico, afundar os submarinos que mencionei acima e explodir o capitólio com um Boeing. "Dívida de Honra" não é novo, foi escrito em 1994 e é impossível não imaginar se essa ideia de destruir o Capitólio com um Boeing não foi lida pelo Osama.

Claro que Jack Ryan e John Clark salvam o dia, inclusive com Ryan chegando à presidência americana, mas isso é sempre esperado. De qualquer modo, o livro é divertido e serve como um bom passatempo.